Dubitando, ad veritatem parvenimus... aliquando! Duvidando, chegamos à verdade... às vezes!
 
A democracia face à conceção bíblica do poder

O regime democrático, aquele mesmo que a História prova ser o menos duradouro, está a falhar à vista de todos, como qualquer outro sistema humano! Perante isto, é necessário agir, apresentando alternativas que assentem em bases tão intemporais e universais quanto possível.

Ainda que pareça chocante para muitas mentes atuais, a democracia e os seus pressupostos ideológicos estão muito afastados da conceção bíblica do exercício do poder na sociedade! Não estão em causa, aqui, meros condicionalismos históricos e geográficos, mas princípios intemporais e universais, inerentes a qualquer sociedade humana. O que é perfeito não muda.

Ora, a democracia assenta em dois pilares: a vontade do povo como origem do poder e a existência de partidos que se guerreiam entre si.

Pelo contrário, a conceção bíblica aponta para sentidos bem diferentes:

Jesus não pregou a «soberania popular», mas a soberania de Deus, o Reino de Deus (ou dos Céus).

«Não há autoridade que não venha de Deus, e as que existem foram ordenadas por Deus. Por isso, quem resiste à autoridade, resiste à ordem de Deus; e os que resistem trarão sobre si mesmos a condenação» (Rm 13,1-2). Nenhuma autoridade existe se não for dada «do Alto» (Jo 19,11); e deve evitar que a sociedade se torne «como ovelhas que não têm pastor» (Mc 6,34), que «se tornaram pasto de todas as feras do campo, porque se espalharam» (Ez 34,5). Para tal, é gravíssima a responsabilidade dos «pastores (...) que se apascentam a si mesmos», em vez de «apascentar as ovelhas» (Ez 34), como fazem todos aqueles que não têm pejo de usar todas as sujas artimanhas e em arruinar a economia, só para ganharem eles, seja a que custo for, desde que destruam os adversários! São os principais causadores de tanta miséria neste mundo, agora e mais ainda no futuro, só para eles próprios ganharem poder e protagonismo, no imediato! Que estes maus pastores «deixem de apascentar as ovelhas, de modo que não se apascentarão mais a si mesmos» (Ez 34, 10)!

Como máximo paradigma dos males resultantes da «soberania popular», Pilatos, em vez de impor a autoridade para libertar Jesus, submeteu a decisão ao voto popular e satisfez a vontade do povo naquele momento: soltou Barrabás e mandou crucificar Jesus, embora reconhecendo-lhe a inocência (Mt 27, 15-26; Mc 15, 6-15; Lc 23, 13-25; Jo 18, 39-40)! Ao satisfazer o veredicto popular expresso por «todos» (Mt 27,22) numa maioria absoluta, Pilatos não teve escrúpulos em comprometer o futuro do povo que reclamava: «O seu sangue caia sobre nós e sobre os nossos filhos» (Mt 27,25)! Este julgamento também é paradigmático em mostrar que a política do ódio e de todo o tipo de vingança tem aceitação muito mais fácil do que a política do amor. Basta lembrar aquele primeiro-ministro que decidiu escolher a função pública como sua principal vítima, e como as sondagens a favor dele subiram logo a seguir! As políticas que fazem mal aos outros dão imenso prazer ao povo! Assim se divide o povo, para reinar sobre ele!

Em vez desta política materialista da competição sem regras morais; da promoção do ódio hipócrita; da exibição do esbanjamento do que devia ser útil aos mais desfavorecidos; do futuro sacrificado em nome das ilusões do imediato; dos que criticam os que estão no poder, só para lá chegarem, mas que, quando lá chegam, ainda fazem pior e mudam os argumentos; dos geradores de copiosas promessas que não cumprem; dos produtores de dívidas em série, que arruínam a economia; dos «providenciais» falsos profetas e dos falsos messias que seduzem muitos; o Novo Testamento apresenta assim os primeiros cristãos de Jerusalém: «Perseveravam na doutrina dos Apóstolos e na comunhão, no partir do pão e nas orações. Em cada alma havia temor, e muitos prodígios e sinais eram feitos pelos Apóstolos. Todos os que acreditavam estavam unidos e tinham tudo em comum; e vendiam as suas propriedades e bens e repartiam-nos por todos, segundo a necessidade de cada um. E perseverando unânimes todos os dias no templo e partindo o pão em casa, comiam com alegria e singeleza de coração, louvando a Deus, e caindo na graça de todo o povo». (At 2,42-46) No entanto, como sempre acontece, também o modelo coletivista daqueles primeiros cristãos rapidamente os deixou na pobreza, sendo necessário levar-lhes ajuda externa (Rm 15, 25-27). Uma sociedade perfeita não se deve esperar neste mundo!

A democracia tem como base o multipartidarismo, que é o oposto da unanimidade. Todavia, a verdade não pode ser contraditória nem dividida. Torna-se, por isso, incompatível com conceções partidaristas. O que a Bíblia diz sobre isto é bem claro: «Rogo-vos, irmãos, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo, que sejais concordes no falar, e que não haja dissensões entre vós; antes sejais unidos no mesmo pensamento e no mesmo parecer» (1 Cor 1, 10). «Rogo-vos, pois, (...) que andeis (...) com toda a humildade e mansidão, com longanimidade, suportando-vos uns aos outros com amor, procurando diligentemente guardar a unidade do Espírito no vínculo da paz» (Ef 4, 1-3). «Para que tenhais o mesmo modo de pensar, tendo o mesmo amor, o mesmo ânimo, pensando a mesma coisa; nada façais por contenda ou por vanglória, mas com humildade cada um considere os outros superiores a si mesmo; não olhe cada um somente para o que é seu, mas cada qual também para o que é dos outros» (Filp 2, 2-4). Etc.. Não parece nada fácil conciliar tudo isto com a prática da democracia!

Neste império do relativismo, não há tantas verdades quantos os partidos: o que há é pessoas mais ou menos afastadas da verdade! Naturalmente, os mais errados são os que mais tentam destruir os outros, a fim de serem eles os únicos com direito de se servirem do poder! É que a verdade tem de ser procurada gradualmente e nunca imposta. Normalmente, não é encontrada no imediato. Nada passa a ser verdade, por ser fanaticamente gritado pelo endeusamento de alguns! Pelo contrário, é desses divinizados falsos profetas e falsos messias, que mais alto erguem os seus hipnotizadores «cantos de sereia», que é preciso fugir! São sobretudo esses que mais afundam as nossas esperanças de um futuro melhor! A cada um de nós, cabe a gravíssima obrigação de não se deixar seduzir por eles e de contribuir para criar alternativas, abdicando dos interesses mesquinhos particulares, neste mundo cheio de ovelhas tresmalhadas (Is 53,6) e de pastores que só se apascentam a si mesmos (Ez 34, 10).

«Sabe, porém, isto: que nos últimos dias sobrevirão tempos penosos; pois os homens serão amantes de si mesmos, gananciosos, presunçosos, soberbos, blasfemos, desobedientes aos seus pais, ingratos, ímpios, sem afeição natural, implacáveis, caluniadores, incontinentes, cruéis, inimigos do bem, traidores, atrevidos, orgulhosos, mais amigos dos prazeres do que amigos de Deus, tendo aparência de piedade, mas negando-lhe o poder. Afasta-te também desses. Porque deste número são os que se introduzem pelas casas, e levam cativas mulheres néscias carregadas de pecados, levadas de várias concupiscências; sempre aprendendo, mas nunca podendo chegar ao pleno conhecimento da verdade. E assim como Janes e Jambres resistiram a Moisés, assim também estes resistem à verdade, sendo homens corruptos de entendimento e réprobos quanto à fé. Não irão, porém, avante; porque a todos será manifesta a sua insensatez, como também o foi a daqueles». (2 Tm 3,1-9) !!!

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